A discórdia entre a população de Corte Sines, concelho de Mértola, e a Sociedade Agrícola da Brava (SAB) arrasta-se desde 1993. Nesse ano, os habitantes da pequena aldeia foram impedidos, pelo dono da Herdade da Brava, de utilizar a única estrada que dá acesso ao Rio Guadiana e que passa pelo interior da propriedade.
Na altura, João Pereira Coutinho (o quinto homem mais rico do país em 2008), proprietário da SAB, justificou a decisão de fechar a estrada alegando que queria instalar uma reserva de caça e garantir o sossego dos animais.
“Esta população nunca fez mal nem prejudicou ninguém. Somos alguns parvos para ir desassossegar os animais?”, questiona, inconformado, António Valadas, habitante de Corte Sines. “Neste país quem tem dinheiro é que manda e o resto é conversa”, acrescenta insatisfeito.
“Desde há muitas décadas”, a estrada de terra batida que passa pelo interior da herdade, dando acesso ao rio, sempre foi utilizada pelos homens, mulheres e crianças que gostavam de ir pescar ou passar um pouco de tempo junto às margens do Guadiana.
No ano 1998, a Câmara Municipal de Mértola quis melhorar o caminho de todos os conflitos. A empresa proprietária da Herdade da Brava colocou uma acção à camara por esta ter “invadido” propriedade privada, a qual o Tribunal de Beja (TB) lhe deu razão num acórdão publicado no ano 2000.
António Valadas não tem dúvida que essa decisão “não foi justa” já que se trata de um caminho municipal. “Esta foi sempre uma estrada do povo. Não temos nada nesta terra. Tínhamos o rio onde íamos à pesca ou nadar no verão. Onde se passeava nos domingos à tarde. Tiram-nos tudo”, desabafa.
A população não ficou de braços cruzados. Através de uma acção popular junto do Tribunal da Relação de Évora (TRE), provando que a estrada é utilizada pela população há seculos, foi revogada a sentença proferida pelo TB. No acórdão publicado no passado dia 5 de Dezembro, o TRE declarou que a estrada é publica.
A Sociedade Agrícola da Brava está obrigada a retirar do caminho os vários portões que colocou em 1993 e deixar livre a circulação da população.
A Rádio Pax deslocou-se à Herdade da Brava para tentar uma reação do proprietário ao acórdão do TRE mas sem sucesso.
João Pereira Coutinho poderá agora recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça ou até para o Tribunal Constitucional.
“O resultado deste tribunal só prova que a população de Corte Sines tinha razão”, afirma Joaquim Nascimento, residente na aldeia, e acrescenta “ele (João Pereira Coutinho) não se preocupe porque nós não vamos perturbar os animais”.